O fascínio das celebridades

Marcelo Guerra

No próximo dia 29 de abril será realizado o aguardado casamento do príncipe William com Kate Middleton, o que a imprensa anuncia como o “Casamento do Século”, repetindo o que ocorreu com o dos pais do príncipe, o Príncipe Charles e a Princesa Diana.

Recentemente encerrou-se mais uma edição do Big Brother Brasil, novamente com uma enorme audiência. Revistas e sites especializados na vida de celebridades estão entre os mais lidos em todos os tempos. Alguns artistas e esportistas lançam mão desses veículos de comunicação para se promover, sendo presenças assíduas neles. Diante de qualquer acontecimento polêmico, a imprensa busca a opinião não só de especialistas, mas também de celebridades.

De onde vem o fascínio que as celebridades exercem sobre o nosso imaginário? Se você busca uma resposta superficial, pode contentar-se com a natural curiosidade que temos pela vida dos outros, amplificada pela cobertura jornalística. Queremos saber como as celebridades vivem, o que gostam de fazer, o que comem, o que vestem, como são as suas casas.

Há algo mais nesse interesse. Cada celebridade simboliza um ideal. A rainha da Inglaterra é um símbolo de todas as qualidades que podemos atribuir aos ingleses. Podemos imaginar que, todas as tardes, ela senta-se pontualmente às 5h para tomar um chá com sua família real, e nos surpreenderíamos se ela saísse nesse horário para pegar um lanche num drive-thru de alguma lanchonete. Ela carrega toda a tradição da realeza e dos costumes ingleses. Cada cidadão inglês pode , assim, identificar-se com a rainha.

Em relação a artistas ou esportistas, cada um representa um atributo que podemos admirar ou invejar. Podemos admirar a alegria transbordante de Ivete Sangallo, a determinação de Ayrton Senna e o desejo de chocar de Lady Gaga. Cada um terá sua legião de admiradores. Eu posso admirar aquele traço que ainda pretendo desenvolver na minha vida, ou aquilo que nunca ousaria fazer, mas que a celebridade fez em meu lugar. Dificilmente veremos alguém vestido com bifes de carne numa festa, mas muitos admiraram a Lady Gaga por ter tido a ousadia de vestir-se assim, pretensamente sem importar-se com a opinião alheia.

Na adolescência é comum a busca por ídolos que representem um ideal de vida. O adolescente busca, através dos ídolos, um modelo daquilo que pretende ser quando adulto. Quando eu era adolescente, meu grande ídolo era o Zico, craque do Flamengo, e ainda hoje o admiro muito. Minha admiração não se restringia à habilidade com que jogava futebol, mas também à seriedade, ao compromisso com o time e ao exemplo de superação de situações adversas.

No caso específico de um casamento de um príncipe com uma mulher de classe média, o simbolismo torna-se ainda mais forte, já que muitas mulheres e adolescentes alimentam a fantasia inconsciente de encontrar um príncipe encantado. Kate encontrou um príncipe de verdade! Seu casamento reafirma a todas as mulheres que é possível , mesmo que o príncipe não tenha título de nobreza.

É pela força da identificação com nossos ideais que as celebridades podem cair em desgraça com uma grande facilidade. Quando alguma notícia desfavorável chega ao público, não é só pelo fato noticiado que as pessoas se sentem decepcionadas, mas pela quebra do símbolo. No fim das contas, aquele ídolo também erra, também tem incoerências, também é humano.

A Magia das Cores

Herman Hesse

Para lá e para cá anda o sopro de Deus,

Céu abaixo e acima, muitas vindas e idas,

Aos milhares as canções que entoa a luz,

Deus torna-se mundo nas cores garridas.

 

O branco pelo preto, o frio pelo quente,

Sentem sempre mútua atração,

O arco-íris aclara-se eternamente,

Depura-se de uma caótica agitação.

 

Assim na nossa alma se transforma

Em mil tormentos e imensas alegrias

A luz de Deus, que a tudo dá forma,

E que como o Sol exaltamos todos os dias.

 

Onde Goethe foi beber sabedoria

Aprendimentos

Manoel de Barros

O filósofo Kierkegaard me ensinou que cultura é o caminho que o homem percorre para se conhecer. Sócrates fez o seu caminho de cultura e ao fim falou que só sabia que não sabia de nada. Não tinha as certezas científicas. Mas que aprendera coisas di-menor com a natureza. Aprendeu que as folhas das árvores servem para nos ensinar a cair sem alardes. Disse que fosse ele caracol vegetado sobre pedras, ele iria gostar. Iria certamente aprender o idioma que as rãs falam com as águas e ia conversar com as rãs. E gostasse mais de ensinar que a exuberância maior está nos insetos do que nas paisagens. Seu rosto tinha um lado de ave. Por isso ele podia conhecer todos os pássaros do mundo pelo coração de seus cantos.

Estudara nos livros demais. Porém aprendia melhor no ver, no ouvir, no pegar, no provar e no cheirar. Chegou por vezes de alcançar o sotaque das origens. Se admirava de como um grilo sozinho, um só pequeno grilo, podia desmontar os silêncios de uma noite!
Eu vivi antigamente com Sócrates, Platão, Aristóteles – esse pessoal. Eles falavam nas aulas: Quem se aproxima das origens se renova. Píndaro falava pra mim que usava todos os fósseis linguísticos que achava para renovar sua poesia. Os mestres pregavam que o fascínio poético vem das raízes da fala. Sócrates falava que as expressões mais eróticas
são donzelas. E que a Beleza se explica melhor por não haver razão nenhuma nela. O que mais eu sei sobre Sócrates é que ele viveu uma ascese de mosca.

Do livro: “Memórias Inventadas – As infâncias de Manoel de Barros”.